Nanomagnetismo

As buscas atuais relacionadas aos “pequeníssimos magnetos” vêm puxando-nos para os limites de nossa compreensão do magnetismo como um todo, fornecendo novas dores de cabeça para os tecnologistas e novas oportunidades para pesquisadores investigarem o magnetismo no nível atômico e mesoscópico (entre o micro e o macro). Nesta área, nossas principais atividades concernem os chamados nanodiscos magnéticos e outras nanoestruturas de formas diversas. As energias envolvidas são a magnetostática (de longo alcance) e a de “exchance” (curto alcance) que competem entre si. Nas nanoestruturas com formatos de discos, dependendo da dimensão (raio da ordem de 100nm e espessura da ordem de 15nm), a competição das energias magnetostáticas e de exchange podem gerar como estado fundamental um estado denominado vórtice de spin. Ao longo da maior parte da superfície (não-lateral) do disco, os spins que formam o redemoinho tipo vórtice (devido à interação de exchange) que tende a ficar paralelo ao plano (devido à energia magnetostática); Assim, eles geram a configuração circular definida por uma quiralidade (que pode ser positiva ou negativa, dependendo do sentido da circulação); mas no centro do vórtice, para a minimização da energia, a tendência é dos spins apontarem para fora do plano, formando um caroço central com uma polarização que também pode ser positiva (se os spins apontarem para fora do disco) ou negativa (se apontarem para dentro). Estes objetos têm estabilidade topológica. O estado excitado mais simples consiste no movimento circular do caroço do vórtice em torno do centro do disco, denominado movimento girotrópico.

Vórtices em nanodiscos magnéticos. A figura verde mostra o caroço central do vórtice; o sentido do mesmo indica a polarização do vórtice (positiva ou negativa). A natureza parece gostar de repetir o padrão de um vórtice em diferentes escalas de espaço-tempo: galáxias, furacões, nanodiscos magnéticos etc.

Nossos principais resultados concernem a dinâmica do caroço do vórtice, principalmente em nanodiscos contendo defeitos, tanto do tipo ponto quanto do tipo linha. Defeitos do tipo ponto podem ser impurezas naturais que ocorrem em qualquer sistema magnético ou mesmo quando cavidades (buracos) são intencionalmente introduzidas por técnicas de litográfia. Defeito do tipo linha foi uma proposta do grupo, considerando que os nanodiscos pudessem ser formados por semidiscos construídos de materiais diferentes; assim, na junção entre os semidiscos, existe um defeito do tipo linha.

Nanodiscos magnéticos contendo defeitos tipo buraco e tipo linha. Existem nanomateriais magnéticos com outras formas como quadrada etc. Nosso grupo estudou também a formação de vórtices em nanotoros.

Outro assunto que consideramos com grande ênfase é a formação de nanoSkyrmions e suas redes. Recentemente (por volta de 2010), Skyrmions foram diretamente observados em magnetos chirais; eles se cristalizam em redes triangulares em uma forma denominada “six-folder-order” como mostra a figura abaixo. Trabalhamos para entender como desordem pode afetar o cristal de Skyrmions, considerando efeitos de concentrações de impurezas não-magnéticas (vacâncias de spin aleatoriamente distribuídas no sistema). Consideramos também a dinâmica destes nanoSkyrmions isolados ou em suas redes.

Rede de Skyrmions em um magneto chiral. À esquerda o sistema se encontra limpo (sem impurezas presente) enquanto à direita, impurezas não-magnéticas são incluídas.

Pequenas observações sobre skyrmions

Nos materiais magnéticos, cada átomo é como se fosse um pequeníssimo imã (na linguagem dos físicos dizemos que tais átomos possuem spin). Estes pequeninos imãs interagem um com o outro, em geral, por foças dipolares (parecido com aquelas brincadeiras de criança, aproximando com as mãos dois imãs de geladeira) ou por forças de troca (uma força mais sofisticada, de curto alcance e de natureza quântica). Hoje em dia os físicos conseguem produzir materiais magnéticos de baixas dimensionalidades (tipo uma linha de átomos magnéticos ou um plano de átomos magnéticos). Estes materiais são um universo aparte, possuindo seu próprio vácuo e suas próprias excitações elementares. Agora imagine um material magnético bidimensional (uma superfície de imãs atômicos fixados em posições adequadas de uma rede regular). Imagine também que estes imãs possam se representados por uma pequena seta ou spin (tal seta nos informa a orientação do imã como na bússola). Dependendo das circunstâncias, as interações acima mencionadas podem fazer com que os imãs atômicos (as setinhas) se orientem (em certas regiões do material) para formar verdadeiros turbilhões, alguns conhecidos como vórtices (parecem furacões, com as setinhas formando um redemoinho), outros conhecidos por skyrmions (mais complexo que um vórtice, pois as setinhas além de formarem o turbilhão, ainda se orientam em direções perpendiculares ao plano magnético, apontando em sentidos opostos quando se vai do centro do skyrmion para sua extremidade). Estes objetos são topológicos e possuem alta estabilidade. É muito difícil destruí-los após serem criados (no sentido topológico, podemos dizer que desfazer um skyrmion é tão difícil quanto desfazer um nó cego num barbante). Estes objetos foram previstos e estudados desde as décadas de 1970-1980, associados a estados topológicos da matéria (razão do premio Nobel de Física do ano Passado). Mas somente por volta de 2010, skyrmions magnéticos foram observados pela primeira vez de uma maneira direta, usando microscopias modernas tipo AFM em materiais magnéticos conhecidos como chirais (na verdade nanoscopias, pois tais objetos têm dimensões na escala manométrica, ou seja, na escala de 1mm dividido por mil; mas o nome microscopia permanece por razões históricas). Nestes materiais chirais, existe uma quebra de simetria associada à imagem no espelho. A grosso modo, isto significa dizer que a imagem deste sistema refletida por um espelho não é exatamente idêntica ao sistema propriamente dito. Neste caso especifico, como analogia, podemos dizer que os skyrmions nos magnetos chirais são como vampiros, pois não produziriam uma “imagem no espelho”!!!! Nos magnetos chirais podem ser observados skyrmions isolados ou redes ordenadas de muitos skyrmions. Os skyrmions são localizados, possuem uma estrutura robusta e podem se mover sobre o plano magnético e, portanto, se comportam como se fossem partículas (pseudopartículas). Em princípio, estes movimentos podem ser controlados por campos externos (um campo elétrico, uma corrente elétrica, um campo magnético etc) e assim, podemos pensar em usá-los como transportadores de informação codificada para desenvolver novas tecnologias, tais como skyrmiônica, spintrônica etc. Por exemplo, na eletrônica o transportador da informação é o elétron (a carga eletrônica); na skyrmiônica, o transportador da informação seria o skyrmion.

Os Skyrmions possuem propriedades fantásticas: se parecem com partículas difíceis de serem destruídas; possuem uma pequena estrutura interna que pode carregar informação codificada; podem ser observados diretamente através de microscópios modernos (tipo AFM); podem ser manipulados por meios de aplicações de campos externos, adquirindo movimento sobre o meio magnético etc. Exibindo estas propriedades, então, ficou fácil para que os físicos e tecnologistas logo percebessem que estes objetos se tornavam sérios candidatos para o desenvolvimento de novas tecnologias. Por exemplo, eles poderiam ser os elementos básicos para a ampliação da capacidade de armazenamento de dados em computadores, celulares e todo tipo de produto eletrônico conhecido nos dias atuais. De fato, visto que skyrmions possuem tamanhos da ordem de 1 nanômetro, cerca de cem vezes menores que as peças elementares de informação dos discos rígidos atuais (conhecidas como domínios magnéticos), então, as possíveis tecnologias baseadas nestes elementos poderiam aumentar a densidade de armazenamento de dados e informação de aproximadamente cem vezes mais que as memorias magnéticas convencionais. Além disto, por serem muito robustos, os skyrmions poderiam resistir a uma serie de efeitos involuntários provocados por variações de temperaturas, interferências eletromagnéticas, defeitos presentes no material magnético etc., protegendo de forma segura e eficiente a informação codificada em sua estrutura de spins (as setinhas) no formato de números binários (tipo zero ou um). Em resumo, podemos pensar em desenvolver novas tecnologias de informação e comunicação muito mais eficientes que as atuais usando estes turbilhões magnéticos em vez dos familiares elétrons.

Recentemente, o grupo do professor Geoffrey Beach do MIT a colocou alguns skyrmions isolados numa fita magnética, conseguindo também movê-los com o uso de uma corrente elétrica (spin polarizada). Tudo feito em temperatura ambiente, o que facilitaria bastante o uso de skyrmions em novas tecnologias. Note que conseguir produzir um skyrmion (ou vários) na temperatura ambiente é um grande avanço para a produção de novos produtos tecnológicos comercializáveis (por razões óbvias). Mas existem ainda limitações de como produzi-los de forma isolada e completamente controlada. Além disto, ao tentar movimentar estes skyrmions ao longo da fita magnética, existe ainda um novo problema: eles têm a tendência de se desviar para as bordas laterais da fita devido a um fenômeno conhecido por efeito Hall de skyrmion. Isto é muito ruim e parece que o grupo do professor Beach está tentando contornar o problema. Nesta mesma linha de skyrmions em fitas magnéticas, nosso grupo aqui no Departamento de Física da UFV publicou um trabalho este ano (em colaboração com chineses e japoneses) que contorna este problema introduzindo um tipo exótico de skymion (que denominamos por skyrmions ressonantes) que são impressos na fita por um nanodisco magnético contendo um vórtice. Devido à ressonância, este tipo de skyrmion não desvia a trajetória e permanece em linha reta ao longo do seu percurso sobre da fita (a referência é R.P. Loreto, W.A.Moura-Melo, A.R. Pereira, X. Zhang, Y. Zhou, M. Ezawa, and C.I.L. Araujo, Creation, transport and detection of imprinted magnetic solitons stabilized by spin-polarized current. Journal of Magnetism and Magnetic Materials, MAGMA 62678 https://doi.org/10.1016/j.jmmm.2017.04.074 (2017)). No entanto, devo ressaltar que existem ainda alguns desafios que devem ser superados pelos físicos e tecnologistas para que os skyrmions possam de fato virar estrelas na indústria e no mercado de celulares, computadores etc. De fato, tal tecnologia (skyrmiônica ou algo similar) deve ainda demorar alguns anos para ser completamente implementada.

Podemos incluir também o fato de nosso grupo estar também trabalhando no nível experimental, principalmente na fabricação e construção de materiais artificiais (nano-estruturas e suas redes) como os gelos de spin artificiais ou em camadas de materiais magnéticos com antidots.

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